quinta-feira, 10 de maio de 2012

Shame [2011]


(de Steve McQueen. Idem, EUA, 2011) Com Michael Fassbender, James Badge Dale, Nicole Beharie, Carey Mulligan. Cotação: ****

Depois de assistir “Shame”, fica até meio óbvia a razão pela qual Michael Fassbender foi sumariamente ignorado pelo Oscar desse ano. Não é segredo que a Academia seja puritana (exemplos históricos estão aí para comprovar), e um filme como esse, onde o sexo é condição latente do protagonista, fica nítida a ojeriza que o filme possa ter causado entre os acadêmicos mais tradicionalistas. O que é uma pena. Não só por Fassbender, mas o filme como um todo tem uma carga a mais de charme, plasticidade e um bom trabalho de direção, que fica até chato diminuir o filme como “aquele que tem Michael Fassbender pelado e fazendo muito sexo”. Eu até peço permissão para comparar o trabalho do ator sensação de 2011 com o que Marlon Brando fez em “Último Tango em Paris”, grande clássico do mestre Bertolucci. 

O tão comentado trabalho de Fassbender foi dar vida à Brandon (Michael Fassbender), um homem aparentemente comum, trabalhando em uma empresa de negócios, que possui um amplo apartamento em uma ótima região. Mas o que Brandon não sabe, ainda, é que o fato de dar prioridade ao seu prazer sexual pode ser um problema sério. Ele se masturba o quanto pode, adora contratar prostitutas, flerta com o máximo de desconhecidas possível para garantir qualquer rapidinha e é assíduo consumidor de pornografia, a ponto de ter uma pesada coleção de revistas e DVDs, e deixar o computador do trabalho corrompido de tanto material pornográfico contido.  Ele só começa a se dar conta de uma comprovada compulsão sexual após a chegada da irmã – a problemática cantora Sissy (Carey Mulligan) - em sua casa. Desse reencontro, uma inevitável relutância de Brandon em se dar conta que o seu prazer se tornou uma obsessão.

Assistindo a “Shame”, é possível fazer todo um traçado para comparar Brandon a qualquer outro viciado em uma droga, digamos, mais devastadora, segundo a sociedade. Ele, ao encarar uma moça numa típica viagem de metrô ao trabalho, parece se deparar com o seu objeto de desejo como um chacal observa uma gazela, com um instinto animal atravessando o seu olhar a ponto incomodar a própria moça, que antes retribuía o olhar como flerte. Outra comparação possível é a própria deterioração da personalidade do protagonista, e a sua sensação de saciedade emaranhada com culpa pós-coito. Brandon é um galã, e é nítido que ele não vê dificuldades em encontrar a sua droga, já que ela é oferecida sem grandes problemas, e ainda assim, ele demonstra preferir prostitutas e sexo anônimo, em detrimento de uma relação considerada normal. Todas essas comparações e algumas conclusões só podem ser resultantes do bom trabalho de Steve McQueen, que já dirigiu Fassbender no angustiante "Hunger" (2008), e aqui trabalha com roteiro de Abi Morgan (do questionável "A Dama de Ferro").

E não dá pra deixar de dizer que Michael Fassbender está impecável no papel. O ator alemão consegue fazer algo que parece simples, mas é bem o contrário. Fazer cenas de sexo (as mais fortes possíveis), no caso de “Shame”, não pode – e nem deve - ser excitante. A linha é bem tênue. Estamos falando do drama de um cara compulsivo sexualmente que vai se degradando. E, embora o nu frontal esteja ali, de início, para chamar a atenção do público ansioso, aos poucos nos deparamos com cenas de sexo que incomoda não só os representantes da ação, mas a nós mesmos, que abandonamos a posição de voyeur para ser quase um cúmplice. Nesse quesito, são quase inseparáveis os méritos de Brandon e de McQueen. Este último, por sinal, em aspectos pontuais, sofreu do mal do cinema-artístico-pedante, com seus diálogos de efeito, uso de cores como chamariz primário (o vermelho do sangue, por exemplo), e longas plano-sequências, que me incomodou, especificamente, na cena em que Mulligan canta uma versão devagar-quase-parando de New York, New YorkzZzZzZzZz...

“Shame”, desnudo de polêmicas, é um filme com um potencial incrível, e traz Michael Fassbender capaz de arrancar aplausos, e, porque não dizer, suspiros. 

5 comentários:

  1. Eu tb gosto muito desse filme. Em Hunger, o que vc chama de "cinema-artístico-pedante" é bem mais evidente. Qd comecei a ver Shame, o seu inicio meio parado me fez achar q tb seria como a sua primeira obra, mas felizmente não é. Vc não gostou da cena de New York? Pô, foi bonita, fez até Brandon chorar, aquele sujeito desprovido de emoção...hehe

    Grande Abraço!

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  2. Ah, preciso dizer ou ressaltar o quanto eu quero e preciso ver logo esse filme?

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  3. polêmico, sensual e talentoso... e a carey mulligan é sensacional

    O Falcão Maltês

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  4. Gostei das atuações e do clima, mas no fim, resultou em algo vazio, o que é bastante frustrante pra um assunto tão interessante.

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  5. Gostei muito de Shame. Pra mim, a direção do McQueen é excelente em todos os aspectos (e não consigo resumir o nu frontal de Brandon a um chamariz, mas vejo como uma opção narrativa, já que só aí vemos ele nu, evidenciando sua personalidade introspectiva e fechada). Falando em Fassbender, aliás, ele dá um show a parte que merece todos os aplausos! Ademais, pra mim, a cena de New York, New York é a segunda melhor do filme!

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